Mais fôlego para o Dólar?

Tive uma boa discussão com um amigo (Frederico Meinberg) ontem à noite a respeito das reservas cambiais do Brasil. Ele entende muito mais dessa área que eu e me deu uma boa explicação sobre os potenciais problemas à frente.

Uma das grandes anomalias da fase populista-socialista pela qual o Brasil está passando é exatamente o nível das reservas. Elas pareciam enormes e um seguro para tranquilizar os investidores, especialmente no que tange à solvência externa.

É importante ressaltar que as reservas servem para cobrir o passivo externo, e o nível delas só faz sentido se comparado a esse número. Suspeitamos que o nível delas não seja tão seguro assim.

Parte dessas reservas já está comprometida (dívida federal interna detida pelos estrangeiros), no valor de BRL484 bilhões. Embora esse valor em mãos de estrangeiros não gere risco cambial por si só, ele forma um potencial passivo externo – o estrangeiro que comprou dívida federal em BRL no Brasil planeja converter os juros e o principal recebidos em BRL para USD (ou outra moeda, mas daqui pra frente, vamos mencionar somente o USD) em algum momento no futuro. Isso quer dizer que o Brasil tem que manter mais de USD 100 bi de reservas internacionais somente para garantir a convertibilidade dessa dívida – e o valor em BRL aumenta em 14.25% ao ano.

Claro que isso tem um lado positivo – foi o investidor estrangeiro, não o governo, quem teve que arcar com o prejuízo da desvalorização cambial dos últimos 12 meses. Por outro lado, esse passivo torna no mínimo USD 100 bi de reservas praticamente intocáveis.

Se houver a expectativa de que as reservas não possam cobrir a conversão dessa dívida para dólar, haverá uma corrida entre os estrangeiros para vender dívida pública (mandando os juros para as alturas) e comprar dólares (mandando o dólar para as alturas). Isso ocorreria juntamente com um fluxo de brasileiros que tiverem vontade e habilidade de participar desses movimentos.

Uma das saídas para lidar com esse cenário é a de controles cambiais, para evitar que os BRL sejam convertidos em USD, e mais inflação, para reduzir o valor dos BRL devidos. (Os estrangeiros detêm primordialmente NTN-Fs, em cujo caso a inflação é suficiente para reduzir a dívida real; no caso de NTN-Bs, adiciona-se a manipulação do índice de inflação). Não são tantos passos assim para se chegar a um cenário argentino.

E qual é a plausibilidade de haver uma corrida de venda de dívida e compra de dólar? Depende da expectativa da cobertura desse passivo pelas reservas internacionais. As reservas nominais são de USD 370 bi. Aos USD 100 bi das reservas comprometidas com a convertibilidade da dívida interna em mãos de estrangeiros se adicionam os USD 100 bi que “lastreiam” os swaps do BC. Isso mesmo, o BC vem vendendo USD para conter a alta da moeda (com resultados, no mínimo, duvidáveis).

E há um possível gatilho para essa corrida, cuja magnitude será revelada em breve, quando vier o downgrade da Fitch ou da Moody’s. A partir daí os investidores estrangeiros que não puderem investir em “junk” ficarão desenquadrados. Talvez os regulamentos dos fundos sejam lenientes no que diz respeito a um desenquadramento passivo de dívida que já estiver no portfolio, mas eles ficarão, no mínimo, impossibilitados de se reposicionar ou rolar a dívida vincenda, num momento de déficit crescente no Brasil.

Vale a pena prestar atenção nos movimentos dos estrangeiros nas próximas semanas. Uma corrida dessas poderia causar várias situações de desalinhamento de preços dos ativos brasileiros. Isso sim pode ser uma ótima oportunidade!

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